O Espírito se lembra da sua existência corpórea,
tendo vivido muitas vezes como homem, recorda-se do que foi. E te asseguro que,
por vezes, ri-se de piedade de si mesmo.
Comentário de Kardec:
Como o homem que, atingindo a idade da razão, ri das suas loucuras
da juventude ou das puerilidades da sua infância.
A lembrança da existência corpórea não se apresenta ao Espírito de
maneira completa e inopinada, após a morte; mas pouco a
pouco, como alguma coisa que sai do nevoeiro, e à medida que nela vai fixando a
sua atenção.
O Espírito se lembra e das coisas na razão das consequências que
acarretam para a sua situação de Espírito. Mas compreende que há circunstâncias
às quais ele não atribui nenhuma importância e que nem mesmo procura recordar.
Pode
lembrar-se dos detalhes e dos incidentes mais minuciosos, sejam de
acontecimentos, sejam mesmo de seus pensamentos. Mas quando isso não tem
utilidade, ele não o faz.
Seguramente, entrevê a finalidade da vida terrestre, com relação à vida futura;
a vê e compreende muito melhor do que quando vivia
no corpo. Compreende a necessidade de purificação para chegar ao infinito, e
sabe que a cada existência se livra de algumas impurezas.
A vida passada se desenrola na memória do Espírito, por um esforço da sua
imaginação ou como um quadro que ele tenha ante os olhos.
Todos os atos que tenham interesse para a sua lembrança são para ele como se
estivessem presentes; os outros ficam mais ou menos no fundo da memória, ou
completamente esquecidos. Quanto mais desmaterializado estiver, menos
importância atribui às coisas materiais. Fazes muitas vezes a evocação de um
Espírito errante, que acabou de deixar a Terra e não se lembra dos nomes das
pessoas que amava, nem dos detalhes que para ti parecem importantes:
é que pouco lhe interessam e caem no esquecimento. Aquilo de que ele se lembra
muito bem são os fatos principais, que o ajudam a se melhorar.
O Espírito se lembra de todas as existências que precederam a que acabou
de deixar, pois que todo o seu passado se desenrola diante dele, como as
etapas de um caminho que o viajante percorreu. Mas, como já dissemos, ele não
se lembra de uma maneira absoluta de todos os atos, recordando-os apenas na
razão da influência que tenham sobre o seu estado presente. Quanto às primeiras
existências, as que se podem considerar como a infância do Espírito, perdem-se
no vago e desaparecem na noite do esquecimento.
O Espírito considera o corpo que acabou de deixar, como
uma veste imprópria, que o incomodava e da qual se sente feliz por se ter
desembaraçado.
O sentimento que experimenta à vista do seu corpo em decomposição, quase
sempre o de indiferença, como por uma coisa a que não dá mais importância.
Algumas vezes, ao fim de um certo lapso de tempo, o Espírito reconhece os
ossos ou outras coisas que lhe tenham pertencido. Isso
depende da maneira mais ou menos elevada pela qual considere as coisas
terrestres.
O Espírito
se sente sempre feliz de ser lembrado. As coisas que dele conservamos avivam em
nós a sua lembrança, mas é o pensamento o que o atrai para vós e não os
objetos.
Frequentemente, os Espíritos conservam a lembrança dos sofrimentos que
suportaram durante sua última existência corpórea, e
essa lembrança os faz melhor avaliar a felicidade que podem desfrutar como
Espíritos.
Somente os
Espíritos inferiores podem lastimar os gozos que correspondem à impureza
de sua natureza, e que eles expiam pelo sofrimento. Para os Espíritos elevados,
a felicidade eterna é mil vezes preferível aos prazeres efêmeros da Terra.
Aquele que iniciou grandes trabalhos com uma finalidade útil e que os vê
interrompidos pela morte não lamenta tê-los deixado por acabar,
porque vê que os outros estão destinados a concluí-los. Ao contrário, trata de
influenciar outros Espíritos humanos a continuá-los. Seu objetivo, na Terra,
era o bem da Humanidade; esse objetivo é o mesmo, no mundo dos Espíritos.
Aquele que deixou trabalhos de arte ou de literatura conserva pelas suas
obras o amor que tinha durante a vida em função de sua elevação; segundo
sua elevação, julga-as de outra maneira e frequentemente reprova o que mais
admirava.
O Espírito se interessa ainda pelos trabalhos que se fazem na Terra, pelo
progresso das artes e das ciências, a depender se de
sua elevação ou da missão que possa ter a cumprir. Aquilo que vos parece
magnífico é frequentemente bem pouca coisa para certos Espíritos, que o
admiram como o sábio admira a obra de um escolar. Eles examinam o que pode
provar a elevação dos Espíritos encarnados e seus progressos.
Os Espíritos conservam, depois da morte, o amor da pátria, e
sempre o mesmo princípio: para os Espíritos elevados, a pátria é o universo; na
Terra, é aquela em que possuem maior número de pessoas simpáticas.
Comentário de Kardec: A
situação dos Espíritos e sua maneira de ver as coisas variam ao infinito, na
razão do grau de seu desenvolvimento moral e intelectual. Os Espíritos de uma
ordem elevada geralmente fazem, na Terra, estações de curta duração. Tudo
quanto aqui se faz é assaz mesquinho em comparação com as grandezas do
infinito; as coisas a que os homens atribuem a maior importância são tão pueris
aos seus olhos, que eles encontram poucos atrativos neste mundo, a menos que
tenham sido chamados a fim de concorrer para o progresso da Humanidade. Os
Espíritos de uma ordem intermédia passam mais frequentemente por aqui, embora
considerem as coisas de maneira mais elevada do que durante a encarnação. Os
Espíritos vulgares são de alguma forma os que aqui permanecem, constituindo a massa
da população ambiente do mundo invisível. Conservam, com pouca diferença, as
mesmas ideias, os mesmos gostos e as mesmas tendências que tinham no seu
envoltório corporal. Intrometem-se nas nossas reuniões, nos nossos negócios,
nas nossas diversões, tomando parte mais ou menos ativa, segundo o seu caráter.
Não podendo satisfazer as suas paixões, gozam com os que a elas se entregam, e
as excitam nessas pessoas. Encontramos entre eles alguns mais sérios, que veem
e observam, para se instruir e aperfeiçoar.
As ideias dos Espíritos se modificam muito na vida de espírito; sofrem
modificações muito grandes, à medida que o Espírito se desmaterializa. Ele
pode, às vezes, permanecer muito tempo com as mesmas ideias, mas pouco a pouco
a influência da matéria diminui e ele vê as coisas mais claramente.
É então que procura os meios de se melhorar.
Desde que o Espírito já viveu a vida espírita antes da sua encarnação, de
o espanto, ao reentrar no mundo dos Espíritos, é apenas o
efeito do primeiro momento e da perturbação que se segue ao
despertar. Mais tarde ele reconhece perfeitamente o seu estado, à medida que
lhe volta a lembrança do passado e que se desfaz a impressão da vida
terrestre.
Nenhum comentário:
Postar um comentário