LIVRO
SEGUNDO
MUNDO
ESPÍRITA OU DOS ESPÍRITOS
CAPÍTULO
VII– RETORNO À VIDA CORPORAL
VI- Da Infância
(Questões 379 à 385)
O
Espírito que anima o corpo de uma criança pode ser tão desenvolvido quanto,
ou mais desenvolvido que o de um adulto. Se ele progrediu
mais, pois são apenas os órgãos imperfeitos que o impedem de
se manifestar. Age de acordo com o instrumento de que se serve.
Numa
criança de tenra idade, o Espírito, fora do obstáculo que a imperfeição dos
órgãos opõe à sua livre manifestação, enquanto criança, é natural que os
órfãos da inteligência, não estando desenvolvidos, não possam dar-lhe toda a
intuição de um adulto: sua inteligência, com efeito, é bastante limitada, até
que a idade lhe amadureça a razão. A perturbação que acompanha a encarnação não
cessa de súbito com o nascimento e só se dissipa com o desenvolvimento dos
órgãos.
Comentário de Kardec: Uma observação vem ao apoio desta resposta: é
que os sonhos de uma criança não têm o caráter dos sonhos de um adulto; seu
objeto é quase sempre pueril, o que é um indício da natureza das preocupações
do Espírito.
Com
a morte da criança o Espírito deve retomar imediatamente o seu vigor primitivo, pois que
está desembaraçado do seu envoltório carnal: entretanto, ele não retoma a sua
lucidez, primitiva enquanto a separação não estiver completa, ou seja, enquanto
não desaparecer toda ligação entre o Espírito e o corpo.
O
Espírito encarnado não sofre, durante a infância, com o constrangimento imposto
pela imperfeição dos seus órgãos; esse estado é uma necessidade
natural e corresponde aos desígnios da Providência. É um tempo de repouso para
o Espírito.
Para
o Espírito, a utilidade de passar pela infância é que encarnando-se
com o fim de se aperfeiçoar, o Espírito é mais acessível durante esse tempo às
impressões que recebe e que podem ajudar o seu adiantamento, para o qual devem
contribuir os que estão encarregados da sua educação.
Os
primeiros gritos da criança são de choro para excitar o
interesse da mãe e provocar os cuidados necessários. Não compreendes que, se
ela só tivesse gritos de alegria, quando ainda não sabe falar, pouco se
inquietariam com as suas necessidades? Admirai, pois, em tudo, a sabedoria da
Providência.
O
motivo da mudança que se opera no seu caráter a uma certa idade, e
particularmente ao sair da adolescência é o Espírito
que retoma a sua natureza e se mostra tal qual era. Não conheceis o
mistério que as crianças ocultam em sua inocência; não sabeis o que elas são,
nem o que foram, nem o que serão; e no entanto as amais e acariciais como se
fossem uma parte de vós mesmos, de tal maneira que o amor de uma mãe por seus
filhos é reputado como o maior amor que um ser possa ter por outros seres. De
onde vêm essa doce afeição, essa terna complacência que até mesmo os estranhos
experimentam por uma criança? Vós sabeis? Não; e é isso que vou explicar.
As crianças são os seres que Deus
envia a novas existências e, para que não possam acusá-lo de demasiada
severidade, dá-lhes todas as aparências de inocência. Mesmo numa criança de
natureza má, suas faltas são cobertas pela não-consciência dos atos. Esta
inocência não é uma superioridade real, em relação ao que elas eram antes; não,
é apenas a imagem do que elas deveriam ser, e se não o são, é sobre elas
somente que recai a culpa.
Mas não é somente por ela que Deus
lhe dá esse aspecto, é também e sobretudo por seus pais, cujo amor é necessário
à fragilidade infantil. E esse amor seria extraordinariamente enfraquecido pela
presença de um caráter impertinente e acerbo, enquanto, supondo os filhos bons
e ternos, dão-lhes toda a afeição e os envolvem nos mais delicados cuidados.
Mas quando as crianças não mais necessitam dessa proteção, dessa assistência
que lhes foi dispensada durante quinze a vinte anos, seu caráter real e
individual reaparece em toda a sua nudez: permanecem boas, se eram
fundamentalmente boas, mas se irisam sempre de matizes que estavam na primeira
infância.
Vedes que os caminhos de Deus são
sempre os melhores, e que, quando se tem o coração puro, é fácil conceber-se a
explicação a respeito.
Com efeito, ponderai que o Espírito
da criança que nasce entre vós pode vir de um mundo em que tenha adquirido
hábitos inteiramente diferentes; como quereríeis que permanecesse no vosso meio
esse novo ser, que traz paixões tão diversas das que possuís, inclinações e
gostos inteiramente opostos aos vossos; como quereríeis que se incorporasse no
vosso ambiente, senão como Deus quis, ou seja, depois de haver passado pela
preparação da infância? Nesta vêm confundir-se todos os pensamentos, todos os
caracteres, todas as variedades de seres engendrados por essa multidão de
mundos em que se desenvolvem as criaturas. E vós mesmos, ao morrer, estareis
numa espécie de infância, no meio de novos irmãos, e na vossa nova existência
não terrena ignorareis os hábitos, os costumes, as formas de relação desse
mundo, novo para vós, manejareis com dificuldade uma língua que não estais
habituados a falar, língua mais vivaz do que o é atualmente o vosso pensamento.
A infância tem ainda outra
utilidade: os Espíritos não ingressam na vida corpórea senão para se
aperfeiçoarem, para se melhorarem; a debilidade dos primeiros anos os torna
flexíveis, acessíveis aos conselhos da experiência e daqueles que devem fazê-los
progredir. É então que se pode reformar o seu caráter e reprimir as suas más
tendências. Esse é o dever que Deus confiou aos pais, missão sagrada pela qual
terão de responder.
É assim que a infância
é não somente útil, necessária, indispensável mas ainda a
consequência natural das leis Deus estabeleceu e que regem o
Universo.
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