LIVRO
SEGUNDO
MUNDO
ESPÍRITA OU DOS ESPÍRITOS
CAPÍTULO
III– RETORNO DA VIDA CORPORAL À VIDA ESPIRITUAL
III – Perturbação
Espírita
(Questão 163 à 165)
Deixando o corpo, a alma não tem imediata consciência de si mesma; ela
fica perturbada por algum tempo.
Nem todos os Espíritos experimentam, no mesmo grau e pelo mesmo tempo, a
perturbação que se segue à separação da alma e do corpo, pois
isso depende da sua elevação. Aquele que já está depurado se reconhece quase
imediatamente, porque se desprendeu da matéria durante a vida corpórea,
enquanto o homem carnal, cuja consciência não é pura, conserva por muito tempo
mais a impressão da matéria.
O conhecimento do Espiritismo exerce uma grande influência sobre a
duração maior ou menor da perturbação, pois o
Espírito compreende antecipadamente a sua situação; mas a prática do bem e a
pureza de consciência são o que exerce maior influência.
Comentário
de Kardec: No
momento da morte, tudo, a princípio, é confuso; a alma necessita de algum tempo
para se reconhecer; sente-se como atordoada, no mesmo estado de um homem que
saísse de um sono profundo e procurasse compreender a sua situação. A lucidez
das ideias e a memória do passado lhe voltam à medida que se extingue a
influência da matéria de que se desprendeu, e que se dissipa essa espécie de
nevoeiro que lhe turva os pensamentos.
A
duração da perturbação de após morte é muito variável: pode ser de algumas
horas, como de muitos meses e mesmo de muitos anos. Aqueles em que é menos
longa são os que se identificaram durante a vida com o seu estado futuro,
porque então compreendem imediatamente a sua posição.
Essa
perturbação apresenta circunstâncias particulares, segundo o caráter dos
indivíduos e sobretudo de acordo com o gênero de morte. Nas mortes violentas,
por suicídio suplício, acidente, apoplexia, ferimentos etc. o Espírito é
surpreendido, espanta-se, não acredita que esteja morto e sustenta teimosamente
que não morreu. Não obstante, vê o seu corpo, sabe que é dele, mas não
compreende que esteja separado Procura as pessoas de sua afeição, dirige-se a
elas e não entende por que não o ouvem. Esta ilusão mantém-se até o completo
desprendimento do espírito, e somente então ele reconhece o seu estado e
compreende que não faz mais parte do mundo dos vivos.
Esse
fenômeno é facilmente explicável. Surpreendido pela morte imprevista, o
Espírito fica aturdido com a mudança brusca que nele se opera. Para ele, a
morte é ainda sinônimo de destruição, de aniquilamento; ora, como continua a
pensar, como ainda vê e escuta, não se considera morto. E o que aumenta a sua
ilusão é o fato de se ver num corpo semelhante ao que deixou na terra, cuja
natureza etérea ainda não teve tempo de verificar. Ele o julga sólido e
compacto como o primeiro e, quando se chama a sua atenção para esse ponto,
admira-se de não poder apalpá-lo.
Assemelha-se este fenômeno ao dos sonâmbulos inexperientes que não creem estar
dormindo. Para eles, o sono é sinônimo de suspensão das faculdades; ora, como
pensam livremente e podem ver, não acham que estejam dormindo. Alguns Espíritos
apresentam esta particularidade, embora a morte não os tenha colhido
inopinadamente; mas ela é sempre mais generalizada entre os que, apesar de
doentes, não pensavam em morrer. Vê-se então o espetáculo singular de um
Espírito que assiste aos próprios funerais como os de um estranho, deles
falando como de uma coisa que não lhe dissesse respeito, até o momento de
compreender a verdade.
A
perturbação que se segue à morte nada tem de penosa para o homem de bem; é
calma e em tudo semelhante à que acompanha um despertar tranquilo. Para aquele
cuja consciência não está pura, é cheia de ansiedades e angústias.
Nos
casos de morte coletiva, observou-se que todos os que pereceram ao mesmo tempo
nem sempre se reveem imediatamente. Na perturbação que se segue à morte, cada
um vai para o seu lado ou só se preocupa com aqueles que lhe interessam.
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