domingo, 14 de setembro de 2014

III-O Bem e o Mal- LIVRO TERCEIRO - CAPÍTULO I - Lei Divina ou Natural

LIVRO TERCEIRO
AS LEIS MORAIS
CAPÍTULO I- A LEI DIVINA OU NATURAL
III-         O Bem e o Mal
(Questão 629 a 646)
A moral é a regra da boa conduta e, portanto, da distinção entre o bem e o mal. Funda-se na observação da lei de Deus. 

O homem se conduz bem quando faz tudo tendo em vista o bem e para o bem de todos, porque então observa a lei de Deus.

Distingue-se o bem do mal, pois que o bem é tudo o que está de acordo com a lei de Deus, e o mal é tudo o que dela se afasta. Assim, fazer o bem é se conformar à lei de Deus; fazer o mal é infringir essa lei.

O homem tem meios para distinguir por si mesmo o bem e o mal, quando ele crê em Deus e quando o quer saber. Deus lhe deu a inteligência para discernir um e outro.

O homem, que é sujeito a errar, pode enganar-se na apreciação do bem e do mal e crer que faz o bem quando em realidade está fazendo o mal. Porém Jesus vos disse: vede o que quereríeis que vos fizessem ou não; tudo se resume nisso. Assim não vos encanareis.

A regra do bem e do mal, que se poderia chamar de reciprocidade ou de solidariedade, não pode ser aplicada à conduta pessoal do homem para consigo mesmo. Encontra ele, na lei natural, a regra desta conduta e um guia seguro?

Quando comeis demais, isso vos faz mal. Pois bem, é Deus que vos dá a medida do que vos falta. Quando a ultrapassais, sois punidos. O mesmo se dá com tudo o mais. A lei natural traça para o homem o limite das suas necessidades; quando ele o ultrapassa, é punido pelo sofrimento. Se o homem escutasse, em todas as coisas, essa voz que. diz: chega! evitaria a maior parte dos males de que acusa a Natureza.

Deus criou os Espíritos criados simples e ignorantes. Deus deixa ao homem a escolha do caminho: tanto pior para ele se seguir o mal; sua peregrinação será mais longa. Se não existissem montanhas, não poderia o homem compreender que se pode subir e descer; e se não existissem rochas, não compreenderia que há corpos duros. E necessário que o Espírito adquira a experiência, e para isto é necessário que ele conheça o bem e o mal; eis porque existe a união do Espírito e do corpo.

As diferentes condições sociais existem na Natureza e estão de acordo com a lei do progresso.

Comentário de Kardec: As condições de existência do homem mudam segundo as épocas e os lugares, e disso resultam para ele necessidades diferentes e condições sociais correspondentes a essas necessidades. Desde que essa diversidade está na ordem das coisas é conforme à lei de Deus, e essa lei, por isso, não é menos una em seu princípio. Cabe à razão distinguir as necessidades reais das necessidades fictícias ou convencionais.

O bem e o mal não são absolutos para todos os homens. A lei de Deus é a mesma para todos; mas o mal depende, sobretudo, da vontade que se tenha de fazê-lo. O bem é sempre bem e o mal sempre mal, qualquer que seja a posição do homem; a diferença está no grau de responsabilidade.

O selvagem que cede ao seu instinto, comendo carne humana, é culpado, pois que o mal depende da vontade. Pois bem, o homem é tanto mais culpado quanto melhor sabe o que faz.

Comentário de Kardec: As circunstâncias dão ao bem e ao mal uma gravidade relativa. O homem comete, frequentemente, faltas que, sendo embora decorrentes da posição em que a sociedade o colocou, não são menos repreensíveis; mas a responsabilidade está na razão dos meios que ele tiver para compreender o bem e o mal. É assim que o homem esclarecido que comete uma simples injustiça é mais culpável aos olhos de Deus que o selvagem que se entrega aos instintos.

O mal parece, algumas vezes, ser consequente da força das circunstâncias. Tal é, por exemplo, em certos casos, a necessidade de destruição, até mesmo do nosso semelhante. O mal não é menos mal por ser necessário; mas essa necessidade desaparece à medida que a alma se depura passando de uma para outra existência; então se torna mais culpável quando o comete, porque melhor o compreende.

 O mal recai sobre aquele que o causou. Assim, o homem que é levado ao mal pela posição em que os outros o colocaram é menos culpável que aqueles que o causaram, pois cada um sofrerá a pena não somente do mal que tenha feito, mas também do que houver provocado.

Aquele que não faz o mal, mas aproveita o mal praticado por outro, é culpável no mesmo grau, pois é como se o cometesse; ao aproveitá-lo, torna-se participante dele. Talvez tivesse recuado diante da ação; mas, se ao encontrá-la realizada, dela se serve, é porque a aprova e a teria praticado se pudesse ou se tivesse ousado.

O desejo do mal é também repreensível quanto o mal. Há virtude em resistir voluntariamente ao mal que se sente desejo de praticar, sobretudo quando se tem a possibilidade de satisfazer esse desejo; mas se o que faltou foi apenas a ocasião, o homem é culpável.

Não será suficiente não se fazer o mal para ser agradável a Deus e assegurar uma situação futura; é preciso fazer o bem no limite das próprias forças, pois cada um responderá por todo o mal que tiver ocorrido por causa do bem que deixou de fazer.

Não há ninguém que, por sua posição, não tenham possibilidade de fazer o bem; somente o egoísta não encontra jamais a ocasião de praticá-lo. É suficiente estar em relação com outros homens para se fazer o bem, e cada dia da vida oferece essa possibilidade a quem não estiver cego pelo egoísmo, porque fazer o bem não é apenas ser caridoso mas ser útil na medida do possível, sempre que o auxílio se faça necessário.

O meio em que certos homens vivem é para eles o motivo principal de muitos vícios e crimes, mas ainda nisso há uma prova escolhida pelo Espírito no estado de liberdade; ele quis se expor à tentação para ter o mérito da resistência.

Quando o homem está mergulhado na atmosfera do vício, o mas se torna para ele um arrastamento porém irresistível, não; porque, no meio dessa atmosfera de vícios, podes encontrar grandes virtudes. São Espíritos que tiveram a força de resistir e que tiveram, ao mesmo tempo, a missão de exercer uma boa influência sobre os seus semelhantes.

O mérito do bem que se faz está na dificuldade; não há nenhum em fazê-lo sem penas e quando nada custa. Deus leva mais em conta o pobre que reparte o seu único pedaço de pão que o rico que só dá do seu supérfluo. Jesus já o disse, a propósito do óbolo da viúva.

As pesquisas sociológicas deram motivo a uma reavaliação, em nosso tempo, do conceito tradicional de moral. Entendeu-se que a moral é variável, porque o bem de um povo pode ser mal para outro e vice-versa. Renouvier, entretanto, em “Science de Ia morale”, a compara às matemáticas: é uma ciência que deve fundar-se em puros conceitos. 

Os sociólogos confundiram moral e costumes, mas ultimamente já distinguiram, na confusão dos costumes, uma regra geral, que é a aspiração comum do bem Bergson, em “Lês deux sources de Ia morale et de Ia religion”, estabelece dois tipos de moral: a fechada, que decorre da coação social, e a aberta, que é individual e não se sujeita às convenções. A moral relativa é a convencional, enquanto a moral absoluta é a ditada pela aspiração universal do bem, pela Lei de Deus gravada nas consciências. (N. do T.)

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